quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Existe a possibilidade de uma relação Eu-Tu na rede social?

Já havia feito um post anterior onde relatei muito brevemente a necessidade de nos mostrarmos bons em oposição a nos mostrarmos maus, pois o bom, é socialmente aceito. Como pesquisadora das relações humanas nas redes sociais vejo isso com muito mais frequência nos compartilhamentos e atualizações de status. Alguns dias atras uma pessoa compartilhou “sou o que sou e não o que acham”, pessoa essa que eu conheço bem e fiquei a pensar… “Será que é mesmo o que é e não o que acham?”, “Até onde essa frase é realmente verdadeira?” Na mesma semana me deparei com a noticia de que a página de um professor de filosofia na qual me identifico por seus pareceres altamente críticos, tinha sido suspensa, provavelmente, por suas postagens não terem agradado a massa e que não deixavam de ser a outra face da moeda que muitos desconheciam e ate hoje desconhecem. Muito se fala em ser quem somos, em nos desnudarmos para o outro e é ai que faço a indagação, será que somos quem realmente nos mostramos nessas redes? A algum tempo discuti em um artigo o quanto a socialização tira a autenticidade das crianças, claro, não desprezo a necessidade das regras sociais, como Rousseau em seu livro Do contrato social, discute em como os indivíduos se tornam escravos de suas necessidades e principalmente daqueles que os rodeiam onde se busca o tempo todo aparências, orgulho, reconhecimento e status. Em uma de suas frases cliches “O homem nasce bom, mas a sociedade o corrompe”, não deixa de ter sua razão, o que fazemos com as crianças é molda-las para comportamentos socialmente aceitos onde muitas vezes, sutilmente dizemos através de repreensões que ela não pode ser autêntica quando ela vira pra vovó e diz que não gostou da comida e nós, adultos moldados socialmente dizemos “filho, não devemos falar isso pra vovó, não é educado”, oras, por que não devemos? Devemos ensinar a criança a comer de mau grado e ainda responder quando a avó pergunta se gostou com um sim? É aí que começa todos os sapos engolidos, todos os atos enganosos que fazemos as pessoas, todas as questões não colocadas e tantos adultos mascarados querendo aparecer bonzinhos ou profetizando frases como as citadas acima. Ao se tratar de individuo sociedade, saí do foco sociológico e comecei a flertar com o teórico Martin Buber que define a existência humana de dois tipos diferentes: a um produto de que realmente é e a outra ao que realmente parece. Elas são muitas vezes misturadas, porém, são muito diferentes umas das outras. Ele propõe que cada pessoa tem sua “persona” um arquétipo abordado por Carl Jung onde configura-se a mascara que se está vestindo a fim de agradar os outros para que sejam aceitos, por exemplo, estamos familiarizando com alguém pela primeira vez, usamos então nossa máscara para causarmos uma boa impressão, mas quando ficamos juntos, descobrimos que a primeira vez que nós nos encontramos é diferente do que realmente somos. Nos escritos de Buber, os elementos da relação inter-humana tem como significado comunicar um ao outro como realmente somos, o que ele denomina de palavra principio Eu-Tu, outra palavra principio é definida pelo mesmo autor comoEu-Isso o que a grosso modo, denota as relações objetais precárias de autenticidade. O verdadeiro acontecimento, o nosso desverlar-se conforme descrito por Martin ocorre na esfera da relação entre Eu-Tu e não entre Eu - Isso.A primeira relação leva a confiar e amar enquanto a segunda leva ao ódio, raiva e dor. Por exemplo, um professor e um aluno estão tendo uma discussão sobre um determinado tema, tanto o educador quanto o aluno trocam informações de modo a produzir uma melhor comunicação, o aluno se torna presente no professor e o consequentemente o professor se torna presente no aluno em uma relação totalmente dialógica. No entanto, alguns educadores ainda usam de sua autoridade para ensinar seus alunos conforme acreditam ser o certo e não da forma que o aluno quer que seja, não existe o dialogo e nem a troca, o professor não se presentifica na relação com o aluno e nem o aluno na dele, ambos apenas exercem funções, ensinar e aprender. O homem é basicamente um ser social, desde o momento de nossa concepção no ventre de nossas mães já nos socializamos. Mostramos a nossa mãe o que realmente precisamos e o que realmente somos. De acordo com o desenvolvimento psicossocial de Erik Erikson ,Confiança x Desconfiança , as crianças desenvolvem a confiança de sua mãe ou cuidadores se eles são capazes de cuidar de suas necessidades e se eles são capazes de conforta-los. No entanto, se eles não conseguem atender às necessidades do bebê o mesmo desenvolve a desconfiança em outras pessoas. Este estágio é o período mais crítico e mais importante da vida. A incapacidade de desenvolver a confiança vai levar a crença ao bebê de que o mundo é inconsistente e imprevisível. Presumo que aquelas crianças que desenvolvem desconfiança são suscetíveis à uma relação Eu-Isso.  Ela corresponde ao verdadeiro diálogo proposto por Buber onde define essa relação como dirigir-se ao mundo, à experiência prática no mundo como objetos passíveis de serem conhecidos objetivamente, diferente da relação Eu-Tu, onde a atitude essencial do homem é marcada pelo encontro, relação com outro presente e direta em que se confirma a presença de ambos e o sentido maior desta existência o que ele chama de atitude ontológica e não cognoscente. Quando estamos juntos com nossos amigos muito próximos, nos submetemos muitas vezes ao encontro, onde a experiência com o Tu, dá-se por encontro e na imediatez do instante  E isso é o que inter-humano significa para mim e não mera objetividade onde o Eu vive na experiência cercado de conteúdos, tendo como referência o passado, que é o mundo dos objetos um marco da relação Eu-Isso. Ser amado do jeito que realmente somos em vez de ser amado pelo que não somos é o que todos nós desejamos e levantamos essa bandeira quando o assunto é “Seja o que você é” . Não podemos ser quem somos porque essa atitude gera desconforto para inúmeras pessoas, em um lugar onde pode ser defendido a liberdade de expressão como vem sendo atualmente a rede social pode-se perceber o quanto a mesma não existe, se postarmos algo diferente do que seus seguidores, amigos seja lá o que for quer ouvir já somos vitimas de julgamentos, criticas e corremos ainda o risco de termos nossos perfis denunciados e cabe a nós bancar o preço, a pergunta é? Será que vale a pena bancar um preço social por algo que não somos? É algo semelhante ao que Kurt Cobain disse: “Eu prefiro ser odiado pelo que sou, do que amado por quem eu não sou. ” Mas será que estamos nos mostrando como somos para sermos amados como tal? Usar máscaras é aceitável, mas usá-la o tempo todo não é apropriado. Vale aqui, contabilizar os onus e o bonus de cara relaçao, vale a pena bancar a postura de ser quem eu sou e correr o risco de nao ser compreendida a ser amado com todas a beleza e imposição da relação Eu-Isso?  Dessa forma, eu prefiro ser quem eu sou do que retratar aparições fantasmagóricas de algo que não me pertence enquanto existência. É realmente importante, primeiro conhecer a si mesmo antes de inter-relação com outras pessoas e escolher, consciente, qual das duas posições bancar. 

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